Do Espírito das Leis – Montesquieu

Os poderes intermediários, subordinados e dependentes, constituem a natureza do governo monárquico, isto é, daquele onde um só governa com leis fundamentais. Eu falei dos poderes intermediários subordinados e dependentes: de fato, na monarquia, o príncipe é a fonte de todo poder político e civil. Estas leis fundamentais supõem necessariamente a existência de canais médios por onde flui o poder: pois, se existe num Estado apenas a vontade momentânea e caprichosa de um só, nada pode ser fixo e, conseqüentemente, nenhuma lei pode ser fundamental. 

O poder intermediário subordinado mais natural é o da nobreza. De alguma maneira ele entra na essência da monarquia, cuja máxima fundamental é: sem monarca, não há nobreza; sem nobreza, não há monarca; mas tem-se um déspota. Existem pessoas que imaginaram, em alguns Estados da Europa, que seria possível abolir todas as justiças dos senhores. Não perceberam que queriam fazer o que o parlamento da Inglaterra fez. Acabem, em uma monarquia, com as prerrogativas dos senhores, do clero, da nobreza e das cidades; terão em breve um Estado popular, ou um Estado despótico. Os tribunais de um grande Estado da Europa golpeiam sem cessar, há vários séculos, a jurisdição patrimonial dos senhores e a eclesiástica. Não queremos censurar tão sábios magistrados; mas deixamos ainda para ser decidido até que ponto sua constituição pode ser mudada. Não morro de amores pelos, privilégios das eclesiásticos, mas gostaria que uma vez se fixásse bem sua jurisdição. Não se trata de saber se houve razão em estabelecê-la, mas se foi estabelecida, se faz parte das leis do país, se é relativa a elas em toda parte; se, entre dois poderes que se reconhecem como independentes, as condições não devem ses recíprocas; e se não é indiferente a um bom súdito defender a justiça do príncipe ou os limites que ela sempre prescreveu a si mesma. Assim como o poder do clero é perigoso numa república, ele é conveniente numa monarquia; principalmente naquelas que tendem para o despotismo. Que seria da Espanha e de Portugal, desde a perda de suas leis, sem este poder que sozinho freia o poder arbitrário? Barreira sempre boa, quando não este outra, pois, como o despotismo causa na natureza humana males assustadores, até mesmo o mal que o limita é um bem. 

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Assim como o mar, que parece querer cobrir toda a terra, é detido pelas ervas e os menores pedregulhos que se encontram na orla, assim também os monarcas, cujo poder parece sem limites, são detidos pelos menores obstáculos e submetem seu orgulho natural às queixas e aos pedidos. Os ingleses, para favorecer a liberdade, retiraram todas os poderes intermediários que formavam sua monarquia. Têm razão em conservar esta liberdade; se por acaso a perdessem, seriam um dos povos mais escravos da terra. Law, por uma igual ignorância da constituição republicana e da monarquia, foi um dos maiores promotores do despotismo que já se viram na Europa. 

Além das mudanças que efetuou, tão bruscas, tão inusitadas, tão incríveis, ele queria suprimir os grupos intermediários e acabar com os corpos políticos: dissolvia a monarquias com seus reembolsos quiméricos e parecia estar querendo resgatar a própria constituição.

Título: O Espírito das Leis
Autor: Montesquieu
Instituição: ELO (.org)
Ano: 1748 – 1ª Edição
Nº de Páginas: 061
Tipo: Livro Digital, PDF

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